Resultado não se conta em horas


Escrito em: 23/02/2016 por Anderson Dias

Maria mora em uma grande casa de uma grande capital. Há alguns anos que se mudou em busca de uma oportunidade de melhorar sua vida e de sua família. Sua ocupação? Auxiliar doméstica.

Sem seu cantinho para morar na imensa cidade, achou lar no seu trabalho, em seu pequeno e aconchegante quartinho.

O trabalho de Maria é constantemente elogiado pelos seus patrões. Tudo arrumadinho, do jeito que eles gostam.

O que há de diferente nessa história é que Maria ama dormir até tarde. Quem não ama, correto? Entenda. Não estamos falando de um sono prolongado no fim de semana. Maria dorme de segunda a segunda até as 10 da manhã, enquanto a maioria das suas colegas de profissão acordam de madrugada.

De novo repito: ela é constantemente elogiada pelos seus patrões.

“Eu não ligo se ela acorda as 10 da manhã, contanto que ela termine tudo que ela tem que fazer, eu não ligo”, é o que sempre fala a satisfeita dona da casa.

Agora, responda uma pergunta: como você acha que seria o trabalho de Maria se ela tivesse que seguir um horário fixo de 8 horas diárias.

Se você trabalha levando cargas de um lado para o outro em um galpão, é mais simples medir o conceito que “não tem mais o que fazer por hoje”. Acabam as cargas, acaba o trabalho.

A vida em escritório, ou home office, é muito diferente disso a maior parte do tempo. “Não tem mais o que fazer por hoje” deixa de ser um conceito visual e físico e se torna digital e subjetivo. É mais fácil existir o conceito “não deu tempo de fazer tudo hoje” pra ser um pouco mais realista.

Entretanto, algumas poucas vezes, é possível vislumbrar esse momento de “terminei o que tinha para hoje”. Nesses poucos momentos, somente alguns poucos sortudos podem parar por ai e fazer qualquer outra coisa que vier em mente.

A vida de escritório tem esses infortúnios. Se você termina muito rápido seu trabalho, o que você faz? Se esse fosse o caso de Maria, não acharia difícil ela fazer tudo mais lentamente e com menos ânimo. Afinal, não tem mais o que fazer.

Em um trabalho onde o número de tarefas a se executar é finito, abre-se muito espaço para a procrastinação, lentidão e má execução quando é necessário mostrar que se está trabalhando.

No mundo de Maria não é necessário nada disso. Basta ela terminar seu trabalho e todo mundo se sente feliz.

Seu tempo de sobra permite que ela aproveite a vida.

Para essa Maria dormir é uma coisa muito agradável. Ela também aproveita para se alfabetizar, estar com suas amigas e o que mais lhe der a cabeça, afinal, ela pode. Mérito dela por fazer um trabalho tão bem feito, em tão pouco tempo.

Quando foi a última vez que faltou o que fazer? Pra mim é algo raro, para meus colegas também. É assim no mundo de desenvolvimento de sistemas.

Não há um conjunto finito de tarefas a fazer, elas simplesmente nunca acabam. Tudo sempre evolui, e num passo muito rápido. Logo, a chance de ficar sem a próxima tarefa é quase nula, mas é possível mudar a forma de quanto nos satisfazemos com o que o outro fez.

Precisamos mudar nossa avaliação, resultado não se conta em horas de trabalho.

No mundo agitado dos escritórios, com algum esforço, é possível migrar dessa mentalidade “você não pode ficar parado” e dar espaço para que a vida seja aproveitada.

A forma como consideramos que alguém está trabalhando duro, não pode ser vinculada a estar uma determinada quantidade de horas ao dia trabalhando.

Por algum acaso você é tentado a pensar que a vida de Maria é tão fácil quanto parece? Você pode tentar me convencer com o argumento que uma casa uma vez limpa, limpa ela ficará até o próximo dia. Isso só acontece numa casa em que ninguém mora. Basta dizer que existem duas crianças nesta casa que amam brincar o dia inteiro.

Não se deixe enganar: a questão aqui não é não ter o que fazer. A questão é quando nos satisfazemos com o trabalho de alguém, mesmo que sobre algo a fazer no dia seguinte.

Dependendo do ramo em que você trabalha e da metodologia utilizada, a quantidade de tarefas é pre-determinada para um período fixo de execução. Num ambiente ideal você não fica aguardando até o fim do dia alguém chegar com algo que deve ser entregue naquele exato momento. Em geral é possível planejar a execução das atividades com alguma previsibilidade.

Então:

1. Conheça sua equipe e confie nela

Aprenda a reconhecer a capacidade de produção de cada um dos que trabalham com você. Ao conhecer cada indivíduo é possível confiar que ao passar uma tarefa você terá alguém que irá executar com zelo o que lhe foi passado. Você não terá medo.

2. Aprenda a considerar satisfatória a produtividade de alguém

Observe o andamento do projeto, se alguém conseguiu terminar suas tarefas antes do prazo estabelecido verifique se é possível parar por ai e descansar.

Tente encontrar um ponto onde as entregas são satisfatórias, apesar de ainda existirem demandas em aberto.

3. Sinta o ritmo de negócio, controle as urgências

Nem tudo que é urgente, é de fato urgente. Algumas coisas podem esperar por mais um dia. Priorize o que de fato é urgente com cuidado e você perceberá que existe espaço para negociação.

4. Recompense

Se alguém que você confia fizer um excelente trabalho e terminar antes do previsto, recompense-o.

Deixe sair um pouco mais cedo pra casa, aproveitar o tempo no trabalho com atividades extra, dê espaço para escrever um texto ou um livro, permita que estude uma nova tecnologia. Crie uma recompensa para ele, uma recompensa de tempo livre.

Existem diversas formas de recompensar alguém por ter feito um excelente trabalho, dar tempo para alguém fazer o que quiser pode gerar uma satisfação maior do que, as vezes, percebemos.

Maria, que não se chama Maria, de fato existe e além de aproveitar suas manhãs de descanso está aprendendo a ler e a escrever no tempo que lhe é recompensado após seu esforço diário.